sábado, 5 de julho de 2008

40.Direitos Humanos e Tribunais

Marinho Pinto, Bastonário da Ordem dos Advogados, diz em entrevista no canal de televisão SIC Notícias, sem hesitação, directa e frontalmente, que os lugares em Portugal onde os direitos humanos são mais violados são os tribunais. Está gravado, é só questão de rebobinar.

O Bastonário é assim como o Presidente da dita Ordem, não é propriamente alguém que ia a passar pelos corredores dos estúdios daquele canal e foi filado por lotaria para um inquérito de opinião, representando portanto um juízo douto, experiente de lides e conhecedora de causas.

Ora esta afirmação, vindo de quem vem e recaindo sobre quem recai, é gravíssima, quanto ao seu significado e alcance, não havendo enviusamento possível por mais tortos que sejam os olhos, ou mais acerados que estejam os ouvidos. Tribunais só podem significar uma de duas coisas, se bem que comadres e entrançadas, ou a justiça, coisa abstracta, ou os juízes, coisa concreta.

E a gravidade, gravíssima, é que pelo menos umas das duas, a justiça ou os juízes, violam os direitos humanos, ou cada uma à sua vez, ou as duas de uma assentada e sendo comadres e entrançadas vá-se lá saber onde uma começa e a outra acaba.

Mas não nos afastemos em elucubrações da simplicidade eloquente daquela denúncia, já que ela é suficientemente eloquente por si própria, simples e fácil de perceber, não precisando de explicações ou aprofundamentos. O que interessa reter é que quando uma afirmação ou acusação deste tipo é produzida pelo patrono dos patronos num estado que se diz de direito muito haverá que endireitar pois de direito não tem nada.

E aqui das duas uma, ou achamos muito bem como está - os lugares em Portugal onde os direitos humanos são mais violados são os tribunais – e é só preciso mudar o nome do estado e do regime, podendo sempre ir buscar inspiração a uma ditadura do quinto mundo, ou talvez sexto, ou então reformamos, melhor dizendo, revolucionamos, a justiça e os juízes, que sendo comadres é melhor tratar dos dois de uma assentada.

Enquanto isto se passava em Lisboa, Noronha Nascimento, Presidente do Supremo Tribunal de Justiça – hesitei entre escrever as iniciais com letra grande ou pequena e acabei por cometer um erro de semântica – deslocava-se a Santa Maria da Feira – por coincidência na mesma sexta-feira de Junho do evento anterior – para solidarizar-se, palavra sua, com o fecho do tribunal local, provisoriamente instalado num pavilhão, assim parecia na reportagem da televisão pelas altas vigas e tectos, justificando esse fecho pela falta de condições. «Não há qualidade». São as suas palavras que retive da transmissão. Também se pode rebobinar para confirmar.

Fiquei muito contente, um encher de pulmão e um brado de louvor, apressando-me logo a solidarizar-me, para usar a mesma e sua palavra, com o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro na sua determinação de, não havendo condições, referindo-se seguramente à qualidade da justiça e dos juízes, aferrolhar o tribunal. Pois muito bem, se não têm qualidade nem a justiça nem os juízes que se interdite o estabelecimento. Não posso estar mais de acordo!

Homem de tão grande quilate, douto, experiente de lides e conhecedor de causas, como adjectivei o Bastonário, não iria com toda a certeza inquietar-se com ninharias como a cor das paredes, a altura do tecto, o desenho do mobiliário ou afins, coisas de forma e do corpo, mas teria, isso sim, o olhar elevado, já o advínhamos com magnitude, para coisas de conteúdo e do espírito. Afinal esse é o reino da justiça, da ética, da moral, dos valores e dos princípios e não as estantes, os ficheiros, as secretárias, as cadeiras e os afins.

E, de repente, tive um pressentimento: teria o Presidente do Supremo Tribunal ouvido nesse mesmo dia a grave acusação do Bastonário da Ordem dos Advogados e fazendo jus à sua posição e responsabilidade iniciado, homem sábio e valoroso, o saneamento dos tribunais, justiça e juízes, na demanda de endireita do estado?

E assim persuadido sosseguei. São destes homens, de visão profunda e ampla, que precisamos em tão altos cargos.