sábado, 12 de abril de 2008

18.Em Portugal, há dois países

Há dois países,
um que se mostra, outro que se esconde,
um que nasce da vaidade, outro que morre da vergonha,
um que vive para si, outro que não consegue viver consigo,
um que tem dinheiro, seu ou emprestado, outro a quem falta quase tudo

Há dois países,
um rico, outro pobre, pelo meio o remediado.
O rico não quer saber do pobre, ignora-o, despreza-o,
O pobre, é pobre.

E os pobres desse país são muitos. Não são os que se vêm a pedir, que também o podem ser, não são os que vivem em barracas, que também o podem ser, são sobretudo os que não se vêm, envergonhados e escondidos, válidos mas sem trabalho, com vontade mas sem oportunidade, e esses são muitos, são centenas de milhar, mas não são pessoas, são estatísticas.

Porque é que um homem, uma mulher, capaz, na força da vida, não tem trabalho? Porque é que esse país, o seu governo, não inventa, não cria, não dá trabalho a essas centenas de milhar, não estatísticas, mas pessoas? Porque é que esse país, esse governo, persiste em ser assistencialista, dando o peixe, e não estruturante, dando a cana e ensinando a pescar? Que ideologia, que cultura, que civilização é esta que consegue viver ignorando e desprezando os seus próprios irmãos?

Eu conheço os dois países e sei do que falo. Conheço os ricos e os pobres, conheço a sua maneira de pensar e a sua maneira de sentir, o que idealizam na cabeça e carregam no coração. Sei dos seus interesses e dos seus hábitos, dos seus valores e dos seus sonhos, sei para onde se dirigem.

Sei que os ricos não fazem a mais pequena ideia do que é ser pobre; sei que os ricos julgam que a riqueza vem da virtude, chamada mérito, e a pobreza do defeito, chamado preguiça. Mas estão redondamente enganados!

Há dois países, mas
só num há liberdade, no outro é a escravidão,
só num há justiça, no outro é a sujeição
só num há democracia, no outro é a ditadura.

A democracia é dos ricos, não é dos pobres. Quem vota são os ricos e remediados, não são os pobres. E para quê? Por isso o governo do país rico não governa para o país pobre e falar de justiça social é deitar palavras ao vento.

Quando assim falo, os ricos dizem que exagero, chamam-me dramático, e eu compreendo-os, não sabem do que falo, não conhecem o outro país. Não me esqueço que também fui assim, sem tempo que não fosse para o meu trabalho, sem alcance que não fosse para o meu mundo, e ainda hoje, vezes há, que no meio da correria e da tensão do dia a dia tenho que parar e lembrar-me de que há outro país e outro povo.

“Se uma sociedade livre não pode ajudar os muitos que são pobres,
não pode salvar os poucos que são ricos.”

John F. Kennedy
35º Presidente dos E.U.A. (1917 – 1963)